Minha questão é saber como o ser humano pode viver melhor, e isso só a filosofia é capaz de responder...
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Como os gregos, nós hoje achamos que uma vida mortal bem-sucedida é melhor que ter uma imortalidade fracassada, uma vida infinita e sem sentido. Buscamos uma vida boa para quem aceita lucidamente a morte sem a ajuda de uma força superior." (Luc Ferry)

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

O desejo de amor ou "longing for love"

Bertrand Russell, um dos filósofos mais influentes do século 20, começou sua autobiografia declarando: "Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram minha vida: o desejo de amor, a busca do conhecimento e piedade insuportável pelo sofrimento da humanidade."

À primeira de suas três paixões ele denominou "o desejo de amor" ("longing for love"). É certo que Russell não está sozinho nisso. Todo humano sentirá o desejo de amor ou o desejo de amar e ser amado. Mas aí cabe questionar, sobretudo talvez em casos mais extremos, por que ansiamos tanto por amor? E mais, como é que esse desejo de amor se relaciona com nosso amor-próprio, com a nossa auto-estima? 
Sabe-se, desde Aristóteles, que a virtude está sempre numa faixa entre dois extremos. Pois bem, que atitude poderia ser pensada que nos apontasse para um uma vida entre o egoísmo mais desprezível (exclusivo amor próprio) e o ascetismo dos santos (grau zero de amor próprio)? É importante perguntar, já que não podemos ser santos e obviamente não queremos ser desprezíveis! 

Me parece que não nos servem nem o egoísmo absoluto, nem a falta de auto-estima ou a auto-depreciação do asceta. Embora nem todo asceta se auto-deprecie. Talvez eles não o façam como uma rejeição ao gozo da vida, ou porque a prática é virtuosa, mas sim pela busca da saúde física e metafísica.

De qualquer forma deve haver algum indício patológico nesses estados extremos; a esse propósito, é interessante assistir ao vídeo Autopromoção, autodepreciação e autoflagelação nas relações interpessoais - Flávio Gikovate [uma ressalva quanto ao vídeo é que nem todo mundo que se auto-deprecia está tentando obter vantagens; pode ser auto-estima baixa, se culpando e até se punindo].

O risco é que na ausência de auto-estima, podemos perder o amor mais importante de todos: o amor por si mesmo. Já no egoísmo deixamos de viver algo essencial de nossa humanidade: a conexão com o outro. Como seres sociais, careceremos sempre dessa abertura ao outro. 

Quando jovens, hormônios correndo selvagemente, o desejo de amor é mais um desejo de acasalar, procriar, estabelecer uma vida com alguém. À medida que amadurecemos percebemos que o amor é uma emoção que podemos fazer crescer. Ganhamos autonomia para ir além do amor erótico platônico e caminhar também pelo terreno do amor philia, amor aristotélico ou o ágape, a caridade. Descobrimos que o amor é também o que fazemos dele. Descobrimos que o amor que não ama a si mesmo primeiro é enganoso e, nesse caso, tendemos a amar por todas as razões erradas.

Não ansiaríamos tanto por amor se percebêssemos que o amor nos é dado, simplesmente porque damos amor. Se o aceitássemos como ele é apresentado a nós, não tentando torná-lo mais do que aquilo que ele é, alterando o amor que nos é dado. Não ansiaríamos tanto por amor se acordássemos todos os dias sabendo que somos amados por nós mesmos, se ninguém mais o fizer.

É preciso saber como amar a si mesmo adequadamente, a fim de amar melhor qualquer outra pessoa. Amar-se como se ama o outro (o próximo) e amar qualquer um como se ama a si mesmo. Para alguns, isso vem naturalmente. Para outros esta viagem é muito mais complexa e difícil.